sexta-feira, 29 de junho de 2012


A Mulher Madura



Affonso Romano de Sant'Anna

 
Anouk AiméeO rosto da mulher madura entrou na moldura de meus olhos.

De repente, a surpreendo num banco olhando de soslaio, aguardando sua vez no balcão. Outras vezes ela passa por mim na rua entre os camelôs. Vezes outras a entrevejo no espelho de uma joalheria. A mulher madura, com seu rosto denso esculpido como o de uma atriz grega, tem qualquer coisa de Melina Mercouri ou de Anouke Aimé.

Há uma serenidade nos seus gestos, longe dos desperdícios da adolescência, quando se esbanjam pernas, braços e bocas ruidosamente. A adolescente não sabe ainda os limites de seu corpo e vai florescendo estabanada. É como um nadador principiante, faz muito barulho, joga muita água para os lados. Enfim, desborda.

A mulher madura nada no tempo e flui com a serenidade de um peixe. O silêncio em torno de seus gestos tem algo do repouso da garça sobre o lago. Seu olhar sobre os objetos não é de gula ou de concupiscência. Seus olhos não violam as coisas, mas as envolvem ternamente. Sabem a distância entre seu corpo e o mundo.

A mulher madura é assim: tem algo de orquídea que brota exclusiva de um tronco, inteira. Não é um canteiro de margaridas jovens tagarelando nas manhãs.

A adolescente, com o brilho de seus cabelos, com essa irradiação que vem dos dentes e dos olhos, nos extasia. Mas a mulher madura tem um som de adágio em suas formas. E até no gozo ela soa com a profundidade de um violoncelo e a sutileza de um oboé sobre a campina do leito.

A boca da mulher madura tem uma indizível sabedoria. Ela chorou na madrugada e abriu-se em opaco espanto. Ela conheceu a traição e ela mesma saiu sozinha para se deixar invadir pela dimensão de outros corpos. Por isto as suas mãos são líricas no drama e repõem no seu corpo um aprendizado da macia paina de setembro e abril.

O corpo da mulher madura é um corpo que já tem história. Inscrições se fizeram em sua superfície. Seu corpo não é como na adolescência uma pura e agreste possibilidade. Ela conhece seus mecanismos, apalpa suas mensagens, decodifica as ameaças numa intimidade respeitosa.

Sei que falo de uma certa mulher madura localizada numa classe social, e os mais politizados têm que ter condescendência e me entender. A maturidade também vem à mulher pobre, mas vem com tal violência que o verde se perverte e sobre os casebres e corpos tudo se reveste de uma marrom tristeza.

Na verdade, talvez a mulher madura não se saiba assim inteira ante seu olho interior. Talvez a sua aura se inscreva melhor no olho exterior, que a maturidade é também algo que o outro nos confere, complementarmente. Maturidade é essa coisa dupla: um jogo de espelhos revelador.

Cada idade tem seu esplendor. É um equívoco pensá-lo apenas como um relâmpago de juventude, um brilho de raquetes e pernas sobre as praias do tempo. Cada idade tem seu brilho e é preciso que cada um descubra o fulgor do próprio corpo.

A mulher madura está pronta para algo definitivo. 

Merece, por exemplo, sentar-se naquela praça de Siena à tarde acompanhando com o complacente olhar o vôo das andorinhas e as crianças a brincar. A mulher madura tem esse ar de que, enfim, está pronta para ir à Grécia. Descolou-se da superfície das coisas. Merece profundidades. Por isto, pode-se dizer que a mulher madura não ostenta jóias. As jóias brotaram de seu tronco, incorporaram-se naturalmente ao seu rosto, como se fossem prendas do tempo.

A mulher madura é um ser luminoso é repousante às quatro horas da tarde, quando as sereias se banham e saem discretamente perfumadas com seus filhos pelos parques do dia. Pena que seu marido não note, perdido que está nos escritórios e mesquinhas ações nos múltiplos mercados dos gestos. Ele não sabe, mas deveria voltar para casa tão maduro quanto Yves Montand e Paul Newman, quando nos seus filmes.

Sobretudo, o primeiro namorado ou o primeiro marido não sabem o que perderam em não esperá-la madurar. Ali está uma mulher madura, mais que nunca pronta para quem a souber amar.


O texto acima foi extraído do livro "A Mulher Madura",
Editora Rocco - Rio de Janeiro, 1986, pág. 09.





“Everywhere I go I find a poet has been there before me.”
Sigmund Freud


       A poesia é um filtro da beleza que se oculta na realidade. Ao descrever o desenvolvimento da mulher madura de forma tão apropriada Affonso Romano de Sant'anna descortina o espaço que a psicologia pode atuar no intuito de favorecer a manifestação desta beleza, quando o poeta nos diz:   "Na verdade, talvez a mulher madura não se saiba assim inteira ante seu olho interior. Talvez a sua aura se inscreva melhor no olho exterior, que a maturidade é também algo que o outro nos confere, complementarmente. Maturidade é essa coisa dupla: um jogo de espelhos revelador." Parece revelar um caminho que se utiliza de uma redução da velocidade para que se possa perceber ante ao "olho interior" a graça dos gestos, a harmonia dos silêncios, e o poder da maturidade emocional que se formou ao longo das crises anteriores.  


José Ikeda


       
       

      




 

segunda-feira, 18 de junho de 2012


Pesquisa indica que idosos tendem a ser mais satisfeitos com a vida
Vida longa promove experiências que criam maior tolerância aos desafios


 Satisfação dos idosos pode estar ligada a mais tempo e livre e menos pressões

 Ativo e saudável, sem muito tempo para remoer problemas. Esse é o perfil do novo idoso, como aponta um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Wurzburg, na Alemanha, e de Luxemburgo. Depois de comparar a perspectiva de vida de jovens e idosos, os especialistas concluíram que, atualmente, os mais velhos apresentam mais satisfação com a vida e têm menos chances de sofrer depressão.

— Até algumas décadas atrás, o envelhecimento era considerado sombrio, um tempo de declínio na vida. Era descrito apenas como a época em que os amigos ficam doentes e morrem, em que a pessoa tem movimentos limitados, mais problemas de saúde e um tempo de vida relativamente curto — descreve Stefan Sütterlin, um dos autores da pesquisa, publicada recentemente no Journal of Aging Research.

Sütterlin diz que essa realidade ficou para trás. Para chegar a essa conclusão, ele e seus colegas analisaram um grupo de 300 pessoas (118 mulheres e 182 homens) entre 15 e 87 anos. Por meio de questionários, eles mediram com que frequência os participantes tinham pensamentos negativos, focando principalmente a reflexão ponderada e a preocupação cultivada — essa última sendo a chave para prever sintomas de depressão.

A análise dos dados mostrou que os participantes jovens são muito mais propensos a desenvolver depressão, muito provavelmente devido a pensamentos negativos e a algo que os psicólogos chamam de ruminação, forma de responder às angústias da vida em que a pessoa geralmente pensa que "nada vai dar certo".

Segundo o pesquisador, os jovens podem mostrar satisfação com a vida também: a questão é que eles se sentem depressivos ou alegres com mais frequência e maior intensidade. Os mais velhos mostram, em geral, que sabem se controlar emocionalmente quando estão vivendo alguma dificuldade, e se recuperam mais rápido de algum problema.

Pesquisa em Porto Alegre revela mesma tendência

A segunda edição do levantamento que calcula o Índice de Bem-Estar (IBE) Unimed, uma espécie de termômetro do nível de contentamento da população, também revelou que a felicidade se encontra além dos 60 anos. Os resultados, divulgados em novembro do ano passado, atestam que os entrevistados com mais de 60 anos atingem as maiores médias de bem-estar em nove das 12 dimensões avaliadas, em comparação com as demais quatro faixas etárias pesquisadas.


 Segundo uma das pesquisadoras, o resultado pode ser atribuído ao tempo livre e à ausência da pressão do dia a dia, mais presente em outras fases da vida por conta de obrigações profissionais ou relacionamentos.
— Mas também pode indicar que os idosos são mais tolerantes e se contentam mais facilmente com o que têm — avalia Teniza da Silveira.

Para a gerontologista Gislane Ferreira de Melo, os tempos atuais propiciam um maior bem-estar aos idosos, principalmente pelo fácil acesso às atividades voltadas para eles.

— Muitos avôs e avós tiveram uma infância mais difícil. Antigamente, não havia projetos para idosos. Esse cenário não contribuía para uma maior satisfação com a vida. Hoje, eles estão no computador, nas redes sociais e são acolhidos pela comunidade onde vivem — analisa.

       Achei a notícia muito interessante, pois notamos como a qualidade de vida na velhice é um tema que vem ganhando relevância nos últimos anos. Com o aumento geral da sobrevida da população, é importante para nós, profissionais da psicologia, aprender e se especializar cada vez mais sobre temas específicos da chamada terceira idade. Um suporte psicológico de qualidade pode garantir aos idosos não apenas maior longevidade, mas qualidade de vida, bem-estar subjetivo e satisfação pessoal.

Lucas Klering Juchem

fonte: http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/bem-estar/noticia/2011/11/pesquisa-mostra-que-terceira-idade-e-a-mais-feliz-3553208.htm