quarta-feira, 3 de julho de 2013

Estamos Todos Bem

 
Matteo Scuro (Marcello Mastroianni) é um funcionário de cartório viúvo e aposentado que tem cinco filhos, todos com nomes de personagens de óperas famosas, sua grande paixão. Os filhos, que moram em cidades diferentes da Itália, costumam visitar o pai pelo menos uma vez por ano na Sicília. Dessa vez, extraordinariamente, todos começam a cancelar a visita e Matteo decide visitá-los um por um. Partindo numa viagem de trem que passa por Nápoles, Roma, Milão, Florença e Turim, com direito a um romance pelo caminho, ele acaba descobrindo que não sabe nada da vida dos filhos depois de adultos. Desiludido e profundamente triste por ter se deparado com os problemas e dificuldades dos filhos, Matteo ruma para casa e no caminho sofre um ataque cardíaco. É só aí que ele consegue, no leito do hospital, reunir todos os filhos em torno de si.
Como todos os filmes de Giuseppe Tornatore, Stanno Tutti Bene (título original) fala diretamente com a nossa alma e conta com a emocionante trilha sonora de Ennio Morricone, que curiosamente também atua no filme. Foi prêmio Ocic da crítica ecumênica internacional em Cannes, em 1990.
Toda vez que o personagem de Mastroianni liga para um de seus filhos, a vida agitada da cidade em torno dele é congelada, todos ficam imóveis, e abre-se um silêncio rompido pelo som de mais um recado deixado na secretária eletrônica. Esse foi um recurso usado por Tornatore para dar o tom da expectativa do personagem em falar com o filho, que na verdade está morto.
Estamos Todos Bem é um filme lírico, poético em cada pequeno detalhe. A estupenda interpretação de Marcello Mastroianni – que mesmo o próprio Tornatore tendo admitido anos mais tarde o erro do óculos de míope na composição do protagonista -, emociona no olhar. Lindo! Mais uma obra-prima de Tornatore, que por ter sido lançado apenas dois anos após o igualmente belo Cinema Paradido, acabou sendo ignorado pelo público e pela crítica.
 
O filme demonstra alguns dos principais acontecimentos da velhice. A aposentadoria, como papel social; a diminuição do vigor físico, na parte física; o papel familiar de ser avô e pai, mas apesar disso Matteo  vive só, outro problema dessa etapa da vida, a solidão; e principalmente o fato de se fazer uma revisão da vida. (Papalia, Olds & Feldman 2008).
Matteo ao visitar seus filhos, espalhados por toda a Itália, começa a relembrar e rever sua vida e sua relação com seus filhos. Matteo acreditava que seus filhos estavam todos bem, já que havia sacrificado parte da sua vida para dar a eles uma vida melhor. Porém, ao visitar seus filhos percebe que nenhum deles havia alcançado o êxito que ele tanto almejava.
Conceitos como autonomia, bem-estar-subjetivo e redes de apoio, vistos na disciplina Psicologia e Saúde, são fatores imprescindíveis para a qualidade de vida. E antes de ir visitar seus filhos, e até mesmo na viagem, Matteo aparenta ter qualidade de vida, e de ser saudável biologicamente, psicologicamente e socialmente. Matteo, apesar de idoso, apresenta um alto grau de autonomia, e também um elevado nível de bem-estar-subjetivo. E embora a esposa dele já estivesse morta, ele conversa com ela em vários momentos do filme, fazendo dela sua principal rede de apoio.
Conforme Matteo vai descobrindo que seus filhos não estão bem, passa a negar esse fato, apresentando o mecanismo de defesa da negação, conceito visto nas disciplinas Psicanálise e Saúde Mental e Psicopatologia. Talvez por não suportar que todo seu esforço tenha dado em nada, ou então, pelo fato de seus filhos e netos serem a principal causa de sua qualidade de vida, pois seus filhos eram o motivo de seu bem-estar-subjetivo, eram sua rede de apoio e era por ele acreditar que seus filhos estavam bem é que Matteo estava bem, e se eles não estavam bem, ele Matteo também não poderia estar. Mas, apesar de tudo, Matteo termina o filme afirmando “estamos todos bem”.


 
 
 
                                                                                                 Guilherme Weber Fornari
                                                                                                                        
                                                                      

Um comentário:

  1. Muito interessante a matéria. Já vi "Estamos todos bem" várias vezes e, em cada uma delas, percebo algo diferente, uma expressão do rosto de alguém, um sorriso, uma fala ... e prefiro vê-lo com o som original. Entendo um pouco o italiano e nas dublagens perde-se muito, as mensagens são deformadas.
    O elenco é excepcional e a direção de Tornatore - um craque - muito segura.
    É um filme gigantesco, para ser assistido e depois "pensado" por muito tempo. A realidade dói e como dói!
    Certamente, cada um de nós acaba se identificando com os personagens em algum momento, tanto com o pai quanto com os filhos.
    Uma obra prima. Um filme indispensável.

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